sexta-feira, outubro 27, 2006

Sobre as cheias no nosso Lima...

A chuva dos últimos dias trouxe à memória as cheias no Rio Lima. Frequentes, marcavam a vida da vila. Marcos da história da localidade, são recordadas ora com um tom amargo, lembrando tragédias e prejuízos, ora com alguma nostalgia. O rio dos poetas ganhava outras feicções...
Em Novembro de 1888, o jornal A Voz do Lima referia que "o nosso Lima, cuja mansidão e limpidez tem inspirado bons poetas, tornou-se torvo, de uma braveza indomita, e assim, como esquecido das suas romanticas tradições invadiu esta villa, como ha muitos annos o não fizera, talvez desde 1880, e os campos e veigas marginaes (...). A enchente rapida, e terrivelmente invasora, surprehendeu muitas casas de commercio, onde fez largas avarias, na rua de S. José, e deixou de si ainda uma mais triste recordação. As oito casas que defrontam com o sul no largo de S. João, cinco das quais são de um só andar, foram todas inundadas".
[com excertos do artigo publicado no A Voz do Lima, 14 de Novembro de 1888, nº 120, 3º ano]

quarta-feira, outubro 25, 2006

População em Ponte de Lima (II)


Dando cumprimento a um propósito iniciado há algum tempo, publicamos o segundo gráfico com a evolução do número de fogos e habitantes na vila de Ponte de Lima, com dados entre 1864 e 1981. A apresentação destes dados carece de um enquadramento que não produziremos de imediato. Contudo, notemos, desde já, que será necessário apontar os critérios assumidos na construção dos inquéritos de levantamento, pelos Censos e pelas restantes fontes consultadas, assim como discutir o conceito de "fogo" que está subjacente, para se poder aferir a fiabilidade dos números.
Fica a promessa de nova apresentação de dados.

domingo, outubro 22, 2006

Anúncios de Ponte de Lima (I)

Anúncio, publicado no "O Anunciador das Feiras Novas" de 1948, à Pensão Morais, onde se servem "abundantes refeições e vinhos de mesa das mais acreditadas marcas" e se pode usufruir de "magnificos quartos com todo o conforto".

quarta-feira, outubro 18, 2006

O cortejo histórico das Feiras Novas

Encerramos hoje a votação relativa à questão "O Cortejo Histórico das Feiras Novas foi...". Dos 15 participantes, 60% qualificaram o cortejo de fraco, 27% votaram no item satisfatório e 13% afirmaram que não viram. Estas sondagens são reconhecidamente falíveis e não têm (nem poderiam ter) propósitos de análise científica, contudo, são uma nota não negligenciável de participação e de opinião. Corro o risco de escrever algo, expondo algumas ideias.
O cortejo histórico falhou naquilo que é o seu âmago, o guião. Se o propósito era realizar um cortejo centrado no acto comemorativo dos 180 anos das Feiras Novas, esse facto, para além da presença simbólica da Associação dos Bombeiros Voluntários, não teve qualquer visibilidade. Deixo uma questão: não seria digno de circular nas ruas da vila os nomes dos cidadãos ("anónimos", como se costuma dizer) que fizeram as festas no passado, integrando comissões de festas (marcadas pelo amadorismo e "amor à terra")? Ou estaremos sempre agarrados aos "ilustres", às elites e esquecemos a realidade popular que define, em grande medida, a festa.
Não deixarei ainda de notar que não se compreende a exclusão de determinadas festas das freguesias do concelho; qual foi o critério para se evidenciar determinadas festas?
Sendo um cortejo histórico numa festa assente na realização de feira, não seria interessante orientar a apresentação dos quadros de acordo com as feiras do concelho? Depois do livro do Amândio de Sousa Vieira, sabemos que há muita história que não passa apenas pelos momentos fundadores. Um cortejo que fizesse a história da feira e da festa, integrando-a na história de vila e do concelho, ganharia outro dinamismo e os assistentes reconheceriam a sua memória, uma memória colectiva que tem lugar quer para os acontecimentos excepcionais quer para as rotinas e para a vida quotidiana.
Já agora, não seria interessante repensar os carros alegóricos? A sua composição remete para uma "história de conto de fadas" ou para a "carnavalização" da história.
Voltaremos ao assunto.
A partir de hoje pode participar numa nova votação, acedendo através do botão que se encontra no fundo desta página.

terça-feira, outubro 17, 2006

Balanço das Feiras Novas_1908

Não deixa de ser interessante o exercício de confrontar diferentes visões sobre um mesmo acontecimento. Em 1994, escrevemos um artigo no "O Anunciador das Feiras Novas" (ano XI), intitulado "As Feiras Novas no princípio do século" [leia-se séc. XX], no qual traçavamos uma imagem dos festejos assente, em grande medida, nas notícas publicadas na imprensa local. No ano que nos serve de referência, 1908, a imprensa notou o entusiasmo com os preparativos, a chegada de forasteiros e o empenho mobilizador da comissão encarregue da organização da festa, que apelava aos habitantes da vila para "endandeirarem suas casas" (Cf. Eco do Lima, 17.09.1908). Para o leitor fica a sensação de uma preparação dos actos festivos bem sucedida, o que na época, por vezes, se tornava difícil. A leitura do excerto da notícia de "O Commercio do Lima", de 26 de Setembro de 1908, publicado no excelente trabalho de recolha documental e fotografia de Amândio de Sousa Vieira, Feiras Novas 1826-2006, adensa a sensação dos festejos terem correspondido às expectativas criadas. Dizia-se que "o programa foi cumprido fielmente, apenas com a falta, cujo motivo se ignora, do grupo de bailarinas espanholas" (Cf. Feiras Novas 1826-2006, pág. 41). Porém, descentralizando o nosso olhar e consultando a imprensa de outras povoações, percebemos que a leitura é completamente diferente. Denotando outras formas de ver, talvez marcadas por rivalidades locais, o jornal O Independente, considerava que as "festas das Dores" tinham sido "desanimadissimas". Para o articulista, "aproveitavel de todo o programa, só achamos as illuminações e o fogo, de resto um pepineira. As touradas foram o que se chama um verdadeiro fiasco, que certamente não deixaria de envergonhar a commissão". Facto que não estranha, uma vez que "é sempre assim, quando se fazem touradas em Ponte de Lima é só com gado manso". A conclusão, dura, contrasta claramente com a impressão que nos criava a imprensa limiana: "As festas n'aquella villa desmerecendo cada vez mais, não estarão longe de terminarem de uma vez para sempre, o que é mais razoavel do que andar a enganar o forasteiro com espaventosos reclames".
Se é certo que, quanto ao fim da festa, a história foi mostrando que o articulista estava enganado, não deixa de ser relevante notar que a construção do conhecimento histórico implica a crítica e o cruzamento das fontes, portadores de leituras mais ricas, capazes de dar nota da complexidade da realidade. Aquilo a que vamos chamando "limianismo" não se deve transformar num olhar centrado no umbigo; ganhamos todos quando somos capazes de o assumir como uma forma de ler a realidade local imbricada numa teia social e cultural complexa. Há, portanto, um longo trabalho a realizar na historiografia local que ultrapasse as leituras assentes na cronologia, no simples somatório de factos e na concentração nas "grandes individualidades". Comungo, portanto, uma das observações de Carlos Gomes a um dos meus posts (ver post de 25.08.06): é bom ver a entrada de novas abordagens na história local limiana.

sexta-feira, outubro 13, 2006

A partir de hoje tem disponível um novo meio de contacto com o autor deste blogue: anunciadordasfeirasnovas@clix.pt. Endereço aberto a sugestões, críticas, opiniões e envio de propostas de publicação.
Divulgue o blogue e o endereço de correio electrónico a um amigo!

quinta-feira, outubro 12, 2006

O Teatro D. Fernando, uma morte anunciada (II)

A vereação camarária de Ponte de Lima havia, em 1869, anos antes dos incêndios trágicos do Teatro da Trindade e do Teatro do Baquet, chamado a atenção da Administração do Concelho para a situação de segurança precária do Teatro D. Fernando. De acordo com um ofício conservado no Arquivo Municipal de Ponte de Lima, “achando-se colocado nos baixos d’esta caza [Câmara Municipal] um Theatro, no qual se dão espectáculos públicos em que se queima fogo de artificio, e nos ensaios se fuma sem a menor cautela, estando este edifício em eminente risco, e tanto assim que nas representações, que uma companhia há pouco estacionada n’esta villa, foi mister collocar a bomba e empregados d’ella junto do Theatro por se receiar algum incêndio", a vereação, por unanimidade, deliberou representar junto do Administrador do Concelho para que não permitisse "representações enquanto se não por fiança, ou de caução sufficiente no valor d'esta caza da Câmara, e seu archivo e documentos d’ella, caza de tribunal judicial, caza da administração, da Fazenda, e do telegrapho". A segurança do edifício, legítima preocupação dos membros da Câmara Municipal, pode, contudo, "encapotar" uma outra razão para o "cerco" ao Teatro D. Fernando: a necessidade de controlar expressões teatrais consideradas censuráveis pelas elites. Num período de afirmação do ideário burguês e da ideia de Estado-nação, a censura teatral encontrava suporte legal e no "bom gosto". A alegação de questões de segurança serviu, muitas vezes, veladamente, para censurar uma forma de estar no teatro mais "popular".
[com excertos do ofício ao Administrador do Concelho, 27 de Julho de 1869]

terça-feira, outubro 10, 2006

Festival de Jardins_2006






















A flor tem a linguagem de que a sua semente não fala.
A raiz não parece dar aquele fruto.
Não parece que a flor e a semente sejam da mesma linguagem.
Retirada a linguagem
a semente é igual a flor
a flor igual a fruto
fruto igual a semente
destino igual a devir.
E era o que se pedia: igual.

José de Almada Negreiros (1893-1970), Poemas.


Tem, apenas até ao dia 30 de Outubro, a possibilidade de se confrontar com os jardins do Festival deste ano. Estaremos perante projectos de arte com jardins ou projectos de jardins com arte ou, ainda, com espaços hibrídos característicos dos tempos que correm, onde as clássicas fronteiras entre arte e jardim se diluem?

[foto: jcml, aspecto do jardim "A Música da Horta", Festival de Jardins, 2006]

sexta-feira, outubro 06, 2006

Arquitectura em Ponte de Lima (III)

Para os interessados em arquitectura e na sequência do nosso post intitulado "Arquitectura em Ponte de Lima (II)", publicado em 15.09.2006, deixamos mais uma nota bibliográfica sobre a obra de Eduardo Souto de Moura (n. 1952). Trata-se da revista temática ELcroquis (nº 124, 2005) dedicada àquele arquitecto, onde é mencionado o trabalho desenvolvido na Quinta de Anquião, duas moradias situadas num terreno com declive acentuado.

[reprodução da capa da revista El Croquis, nº 124, 2005; para conhecer esta revista de arquitectura deve aceder a www.elcroquis.es]

quinta-feira, outubro 05, 2006

O Teatro D. Fernando, uma morte anunciada.

Em Março de 1888, deflagrou um incêndio no Teatro Baquet, no Porto, que vitimou dezenas de pessoas, produzindo na opinião pública um sentimento de tragédia. Não era a primeira vez que ocorria um incêndio numa sala de teatro naquela cidade. Alguns anos antes, em Julho de 1875, o Teatro da Trindade ficou reduzido a cinzas. Estes acontecimentos alertaram a opinião pública e as autoridades, quer do poder central quer dos municípios, para os problemas de segurança nestes espaços de cultura e divertimento. Ponte de Lima não ficou alheia a esta preocupação. Em 1879, a Câmara Municipal de Ponte de Lima, tendo "sido annunciado no dia de hontem no Commercio do Lima bailes públicos no Teatro de Dom Fernando" e "estando o mesmo fichado á annos pelo motivo de que pode darse um caso de insendio", solicitava ao Administrador do Concelho que tomasse as medidas necessárias para "não consentir taes bailes no mesmo Theatro” (Arquivo Municipal de Ponte de Lima, Livro de actas camarárias, 6 de Fevereiro de 1879). Na sequência da tragédia no Teatro Baquet, foi publicada uma portaria que estabelecia a realização de inspecções e a concretização de obras por parte dos proprietários dos edifícios onde se realizavam espectáculos cénicos. Impressionado pelos acontecimentos, o editorialista do jornal "A Voz do Lima" publicava, no dia 28 de Março, um artigo onde se defendia que o Teatro D. Fernando constituía um perigo. Dizia-se que "o nosso theatro, pequeno e acanhado, com uma sahida apenas, com uns corredores por onde só cabe uma pessoa, n'um caso de sinistro, será o causal de tudo lá ficar". Numa edição posterior (11 de Abril), o jornal reconhecia que não tinha clamado "no dezerto" a sua "voz quando fallamos em que se devia ser condemnado, expropriado até, o nosso pequeno Theatro D. Fernando". Para o autor daquelas linhas, não bastaria encerrar o espaço - "outros dias, outras politicas, empenhos valiosos e lá teremos o mesmo perigo" - era necessário que Ponte de Lima se empenhasse na "completa extincção do theatro" e na construção de um outro "em melhores e mais seguras condições". Perfilhava-se um caminho para o nascimento do novo teatro em Ponte de Lima - o Teatro Diogo Bernardes.

[fontes: Arquivo Municipal de Ponte de Lima e jornal "A Voz do Lima"]
[foto: Teatro Baquet, gravura, Nogueira da Silva, 1863 in Arquivo Pitoresco, v. VI, Lisboa 1863, p. 257]

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